Luta pela permanência na terra e memórias de conflito agrário numa comunidade remanescente quilombola: Lagoa Santa-Ituberá-Bahia, Brasil

Abstract

This study examines a rural black community that defines itself as of Quilombola origin, located in Lagoa Santa, Ituberá, in the state of Bahia, Brazil. The main objective of the study is to understand the process of expropriation of a significant portion of rural land occupied by this black community. We have attempted to demonstrate that both the legal and bureaucratic constraints imposed by the Brazilian government for the legalization of ownership of small plots of land occupied by land grabbers were an important factor in how a small privileged elite accumulated land. Data were collected from interviews and from written sources such as processes of re-appropriation of land and certificates proving the purchase or sale of real estate. By analyzing both written documents and the narratives of those directly or indirectly involved in the conflicts, we have sought to problematize issues of struggle and access to land in Brazil’s post-abolition period. It becomes evident that there is a relationship between the individual and social memories of the rural black community members involved in the conflicts that led to the partial expropriation of their land. This relationship currently projects itself in the community expectations engendered by the prospect of ownership of land that had been expropriated, having its own territory demarcated and granted, as currently required by law in Brazil.

Estudamos a comunidade negra rural de Lagoa Santa, localizada no município de Ituberá, estado da Bahia, Brasil, que se autorreconhece como Remanescente Quilombola. O objetivo principal da pesquisa foi o de compreender o processo de expropriação de parte significativa das terras da comunidade. Procuramos demonstrar que as dificuldades legais e aparatos burocráticos impostos pelo Estado Brasileiro para a regularização fundiária das terras ocupadas por pequenos posseiros representaram um importante fator no processo de acumulação de terras por parte de uma pequena elite privilegiada. Utilizamos fontes orais (entrevistas) e escritas, principalmente processos de reintegração de posse e certidões de compra e venda de imóveis. Através da análise das narrativas daqueles que estiveram direta ou indiretamente envolvidos nos conflitos e dos documentos escritos, buscamos problematizar questões relativas à luta pelo acesso e permanência na terra no período pós-abolição no Brasil. Apreendemos uma relação entre memória individual e social dos membros da comunidade envolvidos nos conflitos que resultaram na expropriação de parte de suas terras, relação que vem projetando-se no tempo presente pela expectativa gerada com a possibilidade da comunidade ter seu território demarcado e titulado, e as terras que outrora lhes foram expropriada reincorporadas sob seu direito de propriedade, conforme estipulado na legislação brasileira vigente.